Contrato Administrativo v Contrato Privado

 A conceção tradicional defende que os contratos administrativos e os contratos privados, no âmbito da Administração Publica, são de índole extremamente diferente. No entanto, esta ideia tem vindo a sofrer alterações ao longos dos tempos. Analisaremos em que medida as mesmas se deram.

Primeiramente, cumpre definir contrato administrativo. Então, um contrato administrativo é um acordo de vontades, através do qual, à luz do Direito Administrativo, se constituem, modificam ou extinguem relações jurídico-administrativas. Aparece regulado pelo art200n1 do CPA.

É um contrato bilateral, como defende o professor Marcelo Rebelo de Sousa, dado o acordo das partes, consistindo num ato positivo e imaterial de forma explícita. Ele distingue-se dos outros elementos do Direito Administrativo exatamente por essa sua bilateralidade, é essa a sua característica estrutural que o distancia das restantes figuras administrativas.

É importante notar que a noção legal dos mesmos é suscetível de ser interpretada em vários sentidos. Por isso, a autora Maria João Estorninho propõe um leque de critérios para que melhor possamos distinguir estes dois tipos de contratos. 

Primeiro, existe o critério da sujeição, que estipula que o contrato privado é inferior ao administrativo. João Caupers faz uma menção a este critério, explicitando que o mesmo tem origem na lei alemã. Este critério é, no entanto, bastante limitado, uma vez que não nos dá qualquer resposta para a qualificação da relação jurídica de que depende a qualificação do contrato.

Em segundo lugar, temos o critério do objeto, podendo este ser uma relação jurídica de direito administrativo ou de direito privado.

Por fim, existe também o critério estatutário, que afirma que o Direito Administrativo é Direito da Administração Pública.

Não nos parece que a utilização de um destes critérios isolado seja a resposta para esta distinção, como defende, por exemplo, o professor João Caupers, que acredita na aplicação do critério da sujeição, ou o professor Paulo Otero, que acredita na simples aplicação do critério estatutário, enfatizando a preferência legal do contrato administrativo relativamente ao ato. Acreditamos, então, que a solução mais viável será antes uma interligação de parâmetros.

De facto, existe doutrina a defender uma aplicação simultânea de diversos critérios. 

É o caso do professor Sérvulo Correia, que admite uma conjugação do critério do objeto com o estatutário, definindo contrato administratrivo como sendo o processo próprio de agir da Administração Pública que regula as relações jurídicas entre pessoas coletivas da Administração ou entre a própria Administração e o particular.

Atualmente, existe uma concepção nova quanto a distinção de contrato administrativo e contrato privado: a de que não faz sentido a dicotomia entre ambos e que se deveria criar um regime comum a toda a contratação.

Este ideal foi introduzida pela União Europeia, que deixou de autonomizar estas categorias e criou um regime dos contratos públicos, estabelecendo uma realidade unitária. 

Esta realidade foi, então, trazida para Portugal com o legislador a transpor estas diretivas, tendo sido criado o Código dos Contratos Públicos. Apesar do mesmo ter denominado uma categoria de contratos de “contratos administrativos”, todos os contratos  públicos são regulados por este Código e são da competência dos tribunais administrativos.

Como se pode ver, a distinção entre contrato administrativo ou contrato privado, emanado pela Administração, deixou de ter qualquer sentido, uma vez que passaram a ter uma base normativa comum.



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